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resultados, análises, expansões

um resumo e conclusões

 

Diante da dificuldade de delimitação de um arcabouço teórico para estudo do urbanismo, optamos por usar a teoria da complexidade como base ontológica. A partir dela, depreendemos a cidade como um organismo complexo, com interações de troca e transformação de grande diversidade de informação em várias escalas.​

Nós, pessoas, estamos para a cidade como órgãos e células estão para o corpo humano. Na perspectiva complexa (ou sistêmica), todos os sistemas formam e são formados por redes de troca de informação, seja essa informação material, conhecimento, cultura, produtos, energia. A cidade é formada pela rede de trocas entre as pessoas, empresas, instituições e demais organizações que compõem a complexidade social. Essas interações são descritas a partir de CAS​.

Para o nosso estudo interessa a distinção entre a cidade-rede e a cidade-física. Entendemos a cidade-rede como o fenômeno social, a interação entre as pessoas e suas organizações sociais, com todos os aspectos (dimensões) culturais, econômicos, religiosos, políticos, materiais etc. E a cidade-física a realização como (intenção de) adequação do espaço físico, construída para “facilitar” e “potencializar” essas atividades e interações sociais, a partir da necessidade de um lugar onde elas ocorram.

Em geral, estudos sobre redes sociais buscam caracterizações topológicas, como quantidade de nós, de conexões, hierarquia, fluxos e dimensionalidade (quantidade de variáveis) de informação, e mesmo dinâmicas como criticalidade, reorganização e crescimento dos nós e/ou grupos organizados dessa rede. O pensamento que nos atrai é  sobre essa relação de afetação da rede social com a cidade construída. O espaço físico obviamente é construído pela sociedade, mas de que maneira interfere de volta nela, mais especificamente: a cidade-física interfere na cidade-rede que a forma?

Para entender essa questão, primeiro revisitamos uma história da evolução da reflexão urbanística desde o séc. XIX, o que permite que façamos uma narrativa de desenvolvimento que parte da configuração geométrica pelo desenho, passando ao estudo de uma ecologia urbana, seguindo para estudos de movimentos sociais e estratégias de decisões participativas.

Na sequência, a perspectiva ontológica que optamos por trabalhar enxerga a cidade como CAS. Isso significa enxergá-la como resultado da troca e transformação de informações entre os elementos que a constituem. Sobre essas redes, apresentamos brevemente um percurso da evolução dos seus estudos tendo como marco temporal o trabalho seminal de Granovetter até o reconhecimento de estruturas típicas da era da Internet.

Refletindo sobre como fazer experiências em urbanismo, e mesmo observar, percebemos que as dificuldades são basicamente de escala, primeiramente pelo próprio plural. Apesar das variáveis que parecem mais óbvias, o conjunto de variáveis que contribuem para o funcionamento das cidades são inúmeras. É um problema de complexidade: quantas são as dimensões (as variáveis, os aspectos) que definem a cidade?

Um outro problema é o do tempo. Quanto tempo duram os ciclos da cidade, quanto tempo elas duram, em quanto tempo se dá seu crescimento, amadurecimento, sua morte? Em quanto tempo ela sofre uma alteração e manifesta qualquer adequação, reação a essa modificação? O problema de observação, nesse caso, é o da escala de tempo.

Entendemos as simulações computacionais como uma opção bastante vantajosa para criação de um “laboratório” para esse tipo de estudo. Elas permitem incluir só as variáveis que queremos, controlar a passagem de tempo, descrever as regras de funcionamento. Isso implica também a mudança da perspectiva, saindo de uma observação para proposição. Construímos, então, um simulador, apelidado de Redinha, para o nosso estudo.

Afinal, como se dá a relação entre cidade-física e cidade-redes que conformam o sistema cidade? A pergunta original da tese era se a geometria da forma urbana interfere na topologia da rede de encontros resultante. A nossa hipótese afirmava não haver impacto da geometria. Encontramos que o resultado foi um tanto quanto mais complexo: a forma per si, não promove estruturas na formação da rede resultante, entretanto, a geometria dos percursos que as pessoas fazem, sim. É a localização dos pontos de origem e destino de deslocamentos que provoca as diferenciações na rede, e o impacto da geometria base é apenas na medida em que restringe o espaço desses encontros.

propostas para um futuro

O simulador Redinha foi desenvolvido dentro de uma estrutura de CAS, usando agentes e uma linguagem de programação orientada a objetos, capaz de representar as diversas propriedades (variáveis) que se deseja estudar. Essa estrutura permite incorporação de uma grande quantidade de elementos, aumentando a complexidade estudada, ou alternando para outros aspectos.

Um primeiro seguimento de estudo futuro que já identificamos na seção de análise dos resultados é referente à relação entre o padrão de distribuição das atividades e a topologia da rede resultante. Esse trabalho pode ser facilmente implementado adotando outros padrões para além dos já realizados, como, por exemplo, uma distribuição das atividades a partir de conexão preferencial.​

Outra investigação de fácil desenvolvimento pode ser desenvolvida a partir da ideia de metabolismo dos agentes. A associação dos agentes às casas e trabalhos pode ser feita a partir de um ranking de preferências destes. A probabilidade de atribuição de um trabalho pode ser relacionada com a distância, por exemplo. Ou ainda, se atribuir o salário aos trabalhos, e o agente escolher a partir de uma probabilidade da ponderação entre distância e salário.

É claro que esse processo de preferência e metabolismo pode ser feito para outros elementos. Futuros estudos podem implementar preferências para localização das atividades como proximidade ou isolamento com outras atividades/construções, atribuir valores para o mapa como uma geografia, e demais critérios. A incorporação de mapas CAD ou GIS e similares ao Google Earth também pode ser implementada, enriquecendo ainda mais as possibilidades, e aproximar os estudos de casos reais.

Como já apontado, o simulador foi feito em Unity, por ser uma plataforma para desenvolvimento de jogos. Além do potencial para estudo e ensino, a identificação de um mecanismo adequado de recompensa poderia gameficar o Redinha. Experimentos montados nas estratégias do jogo podem transformar os usuários numa fonte de crowdsourcing, onde mais relevante do que a capacidade de processamento seria a diversidade de cenários propostos e quaisquer padrões eventualmente identificados.

Esses são alguns estudos futuros que imaginamos usando o Redinha. Entretanto, como temos claro desde o início, os resultados que tivemos são consequências de um sistema lógico, que pretensamente correspondem a uma representação simplificada de certo aspecto da dinâmica urbana. Um passo fundamental para a sequência desta pesquisa é buscar estratégias que permitam identificar ou não os nossos achados no mundo real, de modo a validar esse sistema de representação como ferramenta de estudo e especulação. Uma vez que nossos achados se mostrem análogos ao mundo real, questões como diversidade de informação, tempo de permanência da mesma na rede, e até interrupção de certos fluxos podem vir a ser desenhadas de maneiras mais conscientes, mesmo em redes não obvias e de levantamento difícil como a de encontros entre as pessoas.

tese de doutorado - daniel lenz costa lima

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