Quando se propõe uma intervenção urbana, o que se deseja? Melhorar o desempenho de uma atividade específica? Torná-la mais confortável? Mexer no trânsito? Deixar um espaço mais bonito, mais peculiar, mais universal? Essas são adequações arquitetônicas de um espaço urbano, modificações de atividades que compõem a cidade ou intervenções na dinâmica urbana? Em Readings in Planning Theory, Fainstein e Campbell (2012) partem da dificuldade de definir, delimitar, e mesmo identificar um arcabouço teórico próprio e consistente do urbanismo. A disciplina, pela natureza complexa e multidisciplinar, toca, empresta e adota teorias ou trechos de teorias e metodologias de várias disciplinas afins e vizinhas, como economia, política, ciências sociais, geografia. Entretanto, uma teoria urbana com axiomas próprios e claros continua fugidia. Autores relativamente distantes no tempo como Bailly (1978) e Rashid (2016) também discutem isto. Suas reflexões apontam uma insuficiência das epistemologias comumente utilizadas, sugerindo a necessidade de um corpo teórico que abranja a miríade de informações e fenômenos que estão concorrendo para e na cidade.
Quando partimos da teoria da complexidade, depreendemos que a cidade é um organismo que funciona num nível de complexidade diferente do nosso, operando em várias escalas e com uma diversidade de variáveis. Nós, pessoas, estamos para a cidade como órgãos e células estão para o corpo humano. Nessa perspectiva, todos os sistemas formam e são formados por redes de troca de informação, seja essa informação material, conhecimento, cultura, produtos, energia. A cidade, portanto, é formada pelas redes de trocas entre as pessoas, empresas, instituições e demais organizações que compõem a complexidade social. Essas interações são descritas a partir de sistemas complexos adaptativos (CAS, Complex Adaptative Systems), e têm sido abordadas assim por grupos como os liderados por Karakiewicz, West, Weinstock e Batty, por exemplo.
Nesta tese, nos interessa mais a distinção entre a cidade-rede e a cidade-física que esses pesquisadores tendem a fazer. Consideramos a cidade-rede como o subsistema que comporta a dinâmica urbana, é o fenômeno social, a interação entre as pessoas e suas organizações, com todos os aspectos (dimensões) culturais, econômicos, religiosos, políticos, materiais etc. A cidade-física entendemos como a materialização da cidade, a adequação do espaço físico, construída para facilitar e potencializar essas atividades e interações sociais, a partir da necessidade de um lugar onde elas ocorram.
Em geral, os estudos das redes sociais buscam caracterizações topológicas, como quantidade de nós, de conexões, hierarquia, fluxos e dimensionalidade (quantidade de variáveis) de informação, e dinâmicas como processo de formação, criticalidade, reorganização e crescimento dos nós e/ou grupos organizados dessa rede. Entretanto, não identificamos na literatura discussão sobre a topologia dessas redes sociais e geometria do espaço em que ela acontece. O pensamento que segue é sobre essa relação de afetação. O espaço físico obviamente é construído pela sociedade, mas de que maneira interfere de volta nela, mais especificamente: a cidade-física interfere na cidade-rede que a forma?
Para chegar, e responder, a essa pergunta, partimos de uma reflexão sobre conhecimento/poder, seguindo para uma discussão sobre modelos e teorias. Adotando como base epistemológica a teoria da complexidade, nos debruçamos sobre o problema de como estudar as redes, questões sobre como observar e construir um cabedal de observação suficiente para desenvolver qualquer teoria a respeito.
As simulações computacionais aparecem como uma opção bastante vantajosa, mudando a perspectiva de observação para proposição. Ter um simulador nos leva a apresentação da tese no formato de site: se uma tese é comunicação de como se chega em certa ideia, o formato para internet facilita compartilhar não só os resultados dos experimentos como a própria ferramenta desenvolvida para estudo, permitindo que os demais interessados façam seus próprios testes e modificações do simulador para novos e mais sofisticados estudos.